Anuloplastia mitral percutânea: primeiros resultados em humanos

Gentileza do Dr. Agustín Vecchia. 

Anuloplastia mitral percutâneaNos últimos anos têm surgido novas opções de tratamento percutâneo para a insuficiência mitral (IM). A anuloplastia mitral transcateter com diferentes dispositivos é um procedimento relativamente simples com o potencial de comprimir a origem de ramos da artéria circunflexa por causa da diferente orientação das comissuras mitrais e do seio coronariano.

 

O seguinte trabalho de Park e colaboradores mostra a primeira experiência em humanos de um dispositivo para “cerclagem mitral percutânea”, que teria a vantagem de oferecer tensão sobre o anel protegido e as coronárias da compressão do mesmo.

 

Foram incluídos 5 pacientes com IM em classe funcional III/IV que recebiam tratamento médico completo recomendado pelos guias e com alguns dos seguintes parâmetros ecocardiográficos:

  • área do orifício regurgitante efetivo (AORE) > 0,20 cm2,
  • volume regurgitante > 30 ml,
  • uma fração regurgitante de 50%.

 

  1. Para o procedimento, primeiro procede-se a realizar a canulação das veias subclávia esquerda e alguma das femorais. Utilizando a via subclávia identifica-se o seio coronariano e a veia cardíaca magna mediante uma flebografia;
  2. Em seguida, com um fio-guia 0,014 polegadas (Whisper, Abbott, Chicago, Illinois) posiciona-se um microcateter (Crusade, Kaneka Medix, Osaka, Japão) na veia perfurante septal basal através do qual se passa o septo interventricular com um fio-guia de ponta rígida para chegar ao trato de saída do ventrículo direito;
  3. Utilizando um dispositivo específico o fio-guia é capturado no TSVD e externalizado por via femoral para depois ser recapturado e externalizado rumo à subclávia com um laço.
  4. Depois o sistema de cerclagem é descido, assim como um sistema de proteção coronariana que é posicionado com precisão mediante uma coronariografia.
  5. Finalmente, a cerclagem é tensionada em sistema e, consequentemente, produz-se a diminuição do diâmetro do anel mitral. Este passo é monitorado mediante ecocardiografia transesofágica para alcançar o grau de oclusão ótimo. O dispositivo de tensão é fixado de maneira subcutânea em um bolso similar ao utilizado para os marca-passos.

 

O desfecho primário do trabalho foi o de severidade da insuficiência mitral em um mês. Como desfecho de segurança utilizou-se a ausência de MACE em um mês (morte, IAM, tamponamento cardíaco, cirurgia relacionada ao dispositivo, AVC ou alterações da condução no ECG). O procedimento foi realizado com sucesso em 4 de 5 pacientes, não foi realizado em um paciente devido a uma anatomia venosa atípica. Os pacientes receberam pelo menos 3 meses de DAPT com aspirina e clopidogrel.

 

Impacto da cerclagem nas câmaras cardíacas e na insuficiência mitral: o procedimento reduziu, em ecocardiografia, 14% do diâmetro do anel mitral. Tanto o volume regurgitante quanto o AORE diminuíram no momento do procedimento e continuaram diminuindo em 6 meses de seguimento (reduziram-se 66% e 76% em 6 meses, respectivamente). Também as câmaras cardíacas se reduziram em 6 meses: 34% a AE, 31% o volume de fim de diástole do VE e 31% o volume de fim de sístole do VE. Também foi observada uma redução significativa e duradoura da insuficiência tricúspide.

 

Fibrilação atrial: dois pacientes com fibrilação atrial, um persistente e o outro permanente reverteram a ritmo sinusal após o procedimento. Um no momento do procedimento e o outro 3 meses após o procedimento. Um paciente apresentava FA paroxística prévia ao procedimento e não voltou a repetir episódios durante os 6 meses de seguimento.

 

Desfecho de segurança: um dos quatro pacientes apresentou um pequeno infarto do miocárdio devido à obstrução de um pequeno ramo obtuso marginal. Um sujeito apresentou um bloqueio de ramo direito que foi interpretado como secundário à tração do septo interventricular por parte do dispositivo. Não foram observados bloqueios de AV.

 

Os autores concluem que este estudo de factibilidade é positivo e ressaltam a importância de futuras investigações que utilizem esta técnica.                                 

 

Comentário editorial

Trata-se de um estudo com um muito escasso número de pacientes, mas ainda assim cumpre com seu objetivo de mostrar a factibilidade deste novo dispositivo para o tratamento da insuficiência mitral funcional. Este procedimento mostra resultados promissores e parâmetros de segurança aceitáveis. Ainda é necessário comprovar se realmente neste grupo heterogêneo de pacientes algum destes tratamentos se destaca por sobre o padrão de cuidado atual que consiste em um tratamento médico ótimo, revascularização coronariana e CRT. Talvez o estudo COAPT (em andamento), que compara o Mitroclip vs. cuidado padrão, nos dê esta resposta e o pontapé inicial para futuros estudos randomizados utilizando este e outros dispositivos inovadores.

 

Gentileza do Dr. Agustín Vecchia. Hospital Alemão, Buenos Aires, Argentina.

 

Título original: Mitral Loop Cerclage Annuloplasty for Secondary Mitral Regurgitation First Human Results.

Referência: 10.1016/j.jcin.2016.12.282 JACC Cardiovascular Interventions.


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