Comparados aos pacientes com síndromes coronarianas crônicas, os pacientes com síndromes coronarianas agudas (SCA) têm uma maior probabilidade a longo prazo de apresentar eventos cardiovasculares maiores (MACE). A fim de evitar isso, tanto os guias americanos quanto os europeus recomendam prolongar a dupla antiagregação plaquetária (DAPT) nessa população por pelo menos 12 meses.
No entanto, em pacientes com determinadas características clínicas (idosos, com IRC, com doença vascular periférica, etc.), a DAPT se associa a um maior risco de sangramento (menor ou maior), o que torna necessário buscar uma alternativa para essa população.
Nos últimos anos, diversos ensaios randomizados tentaram resolver esse dilema, observando-se um benefício nos pacientes com DAPT abreviada em desfechos que consistem no balanço de risco isquêmico vs. risco de sangramento (eventos clínicos puros). Dito efeito é sobretudo a expensas do uso de um inibidor P2Y12 específico: o ticagrelor.
O objetivo deste trabalho, recentemente publicado no JAMA Cardiology, foi investigar a segurança da DAPT abreviada e posterior monoterapia com clopidogrel naqueles pacientes com uma SCA tratados com um stent de cromo-cobalto eluidor de everolimus (Abbott).
Levou-se a cabo um estudo multicêntrico, de não inferioridade, com 4169 pacientes com SCA (uma coorte foi o subgrupo de SCA do estudo original STOPDAPT-2 e outra coorte prospectiva própria do STOPDAPT-2 ACS), dos quais foram 56% SCACEST, 20% SACSEST e 20% anginas instáveis.
Todos os pacientes receberam aspirina mais um segundo inibidor P2Y12 (clopidogrel 75mg/dia ou prasugrel 3,75mg/dia). Posteriormente, no seguimento de 30/59 dias da PTCA, randomizou-se 1-1 para monoterapia com clopidogrel vs. continuação da DAPT (os pacientes com prasugrel passaram a tomar clopidogrel).
O desfecho primário é uma combinação de MACE (morte cardiovascular, IAM, trombose do stent, AVC) ou presença de sangramentos (TIMI maior ou menor). No seguimento de um ano, a terapia abreviada com DAPT, de 1 ou 2 meses, e posterior monoterapia com clopidogrel não alcançou o limite de não inferioridade (HR 1,14 IC 0,8-1,6, p = 0,06). Observou-se maior MACE (sobretudo a expensas de IAM) nos pacientes que receberam tratamento abreviado (HR 1,50, IC 0,99-2,26), menor quantidade de sangramentos (HR 0,46, não significativo), sem apresentar diferença em termos de mortalidade.
Conclusões
Em pacientes com SCA que foram submetidos a uma angioplastia com stent de cromo-cobalto eluidor de everolimus (Abbott), a DAPT abreviada de 1-2 meses e posterior monoterapia com clopidogrel não alcançou o limite de não inferioridade, observando-se um menor número de sangramentos maiores, com o custo de aumentar de maneira significativa os MACE.
Comentário pessoal
Recentemente publicaram-se trabalhos e foram feitas metanálises sobre a terapêutica abreviada envolvendo especialmente o ticagrelor. No estudo TICO (monoterapia com ticagrelor depois de três meses de DAPT em SCA) e no TWILIGHT (monoterapia com ticagrelor depois de três meses de DAPT em pacientes com SCA com alto risco de sangramento) foi alcançado o limite de não inferioridade e poderia ser considerada uma estratégia segura (evidência 2A nos guias americanos). Distinto é o caso do clopidogrel, com o qual se observou maior número de MACE na terapia abreviada. Por tal motivo, sua segurança como monoterapia em SCA é discutível, embora não deva ser descartada sua utilidade como alternativa na desescalação.
Dr. Omar Tupayachi.
Membro do Conselho Editorial de SOLACI.org
Referência: JAMA Cardiol. 2022 Mar 2; e215244. doi: 10.1001/jamacardio.2021.5244. Online ahead of print.
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