Estatinas em prevenção primária: questionadas como a AAS?

Esta nova revisão recentemente publicada no BMJ questiona o benefício das estatinas em prevenção primária de pacientes de baixo risco. Os autores argumentam que as estatinas deveriam ser indicadas com maior precaução em prevenção primária considerando o fato de seu benefício absoluto ser quase marginal em pacientes de baixo risco. 

indicación de tratamiento con estatinas

As mudanças nas diretrizes europeias se traduziram em uma grande expansão dos pacientes elegíveis para esta terapia. Em 1987 aproximadamente 8% dos pacientes de mais de 50 anos tinham indicação de recebê-las, ao passo que nas novas diretrizes esta porcentagem atinge 60% considerando a mesma população. Como resultado desta grande expansão em sua indicação o número a tratar (NNT) também aumentou. Para reduzir um evento cardiovascular maior na população de baixo risco era necessário tratar 40 pacientes em 1987 ao passo que, considerando as recomendações das novas diretrizes, é necessário tratar 400. Isso tem um enorme custo para os sistemas de saúde, mesmo com a drástica queda do custo das estatinas nos últimos anos. 

Este debate se deu em ambos os lados do Atlântico. Em 2018 as diretrizes da ACC/AHA enfatizaram a necessidade de discutir com o paciente os prós e os contras da prevenção primária com estatinas, especialmente em se tratando de população de baixo risco. Esta decisão tomada em conjunto com o paciente devia incluir o controle dos fatores de risco maiores, os benefícios da mudança do estilo de vida, o potencial de interações medicamentosas e, logicamente, os custos monetários. As preferências do paciente foram incluídas de maneira definitiva no algoritmo de decisão. 


Leia também: AHA 2018 | Os novos guias de dislipidemia respaldam a terapia sem estatinas e a busca de cálcio coronariano.


Para esta revisão publicada no BMJ os pesquisadores incluíram todos os estudos randomizados publicados desde 1995. Globalmente, as estatinas reduzem o risco de mortalidade por qualquer causa (RR 0,91; IC 95% 0,85-0,97), morte por qualquer causa (OR 0,85; IC 95% 0,77-0,95) e eventos cardiovasculares maiores (RR 0,75; IC 95% 0,70-0,80). Este benefício na população geral varia muito dependendo do risco basal dos pacientes.

Nos pacientes de baixo risco as estatinas não têm impacto na mortalidade, embora ainda sejam capazes de reduzir em aproximadamente 40% a ocorrência de eventos coronarianos. 

Quando a análise inclui somente mulheres não se observa redução do risco em mortalidade por qualquer causa. 

A espetacular redução de eventos em termos relativos pode ocultar uma muito pequena redução em termos absolutos nos pacientes de baixo risco e especialmente em mulheres jovens. 



Leia também: ACC 2018 | SECURE-PCI: Altas doses de estatinas antes da angioplastia poderiam ajudar.


Para dar um exemplo prático, um paciente com um risco cardiovascular em 10 anos inferior a 5% (muito baixo) poderia reduzir a chance de morrer por doença cardiovascular em 20% com as estatinas, mas o intervalo de confiança é muito amplo, tanto que poderia representar desde uma redução do risco de 57% até um aumento do mesmo de 47%.

Título original: Statins for primary prevention of cardiovascular disease.

Referência: Byrne P et al. BMJ. 2019;367:l5674.


Subscreva-se a nossa newsletter semanal

Receba resumos com os últimos artigos científicos

Sua opinião nos interessa. Pode deixar abaixo seu comentário, reflexão, pergunta ou o que desejar. Será mais que bem-vindo.

Mais artigos deste autor

SCACEST e uso de bivalirudina vs. heparina: em busca dos resultados do BRIGHT-4

Diversos estudos e registros demonstraram o impacto das complicações posteriores à angioplastia (PCI) na sobrevivência dos pacientes com síndrome coronariana aguda com elevação do...

TAVI e fibrilação atrial: que anticoagulantes deveríamos usar?

A prevalência de fibrilação atrial (FA) em pacientes submetidos a TAVI varia entre 15% e 30%, dependendo das séries. Essa arritmia está associada a...

Stents de hastes ultrafinas vs. stents de hastes finas em pacientes com alto risco de sangramento que são submetidos a angioplastia coronariana

Vários estudos in vivo demonstraram que os stents com hastes ultrafinas apresentam um menor risco trombogênico do que os stents com hastes finas, o...

Devemos suspender a anticoagulação antes do TAVI?

Aproximadamente um terço dos pacientes que são submetidos a TAVI apresentam fibrilação atrial e estão sob tratamento com anticoagulantes orais (ACO). Isso cria um...

LEAVE A REPLY

Please enter your comment!
Please enter your name here

Artigos Relacionados

Congressos SOLACIspot_img

Artigos Recentes

Estudo TRI-SPA: Tratamento borda a borda da valva tricúspide

A insuficiência tricúspide (IT) é uma doença associada a alta morbimortalidade. A cirurgia é, atualmente, o tratamento recomendado, embora apresente uma elevada taxa de...

Estudo ACCESS-TAVI: Comparação de dispositivos de oclusão vascular após o TAVI

O implante transcatéter da valva aórtica (TAVI) é uma opção de tratamento bem estabelecida para pacientes idosos com estenose valvar aórtica severa e sintomática....

Tratamento endovascular da doença iliofemoral para melhorar a insuficiência cardíaca com FEJ preservada

A doença arterial periférica (EAP) é um fator de risco relevante no desenvolvimento de doenças de difícil tratamento, como a insuficiência cardíaca com fração...