A aspirina em prevenção primária: outra “tendência na moda” nas publicações

A aspirina é um tratamento padrão na terapia médica ótima no contexto da prevenção secundária da doença aterosclerótica diagnosticada e estabelecida.

ticagrelor vs. aspirina

Embora seu risco de sangramento seja mínimo durante o curto tempo que pode ser administrada em um evento agudo, este risco se incrementa substancialmente com o tempo.

Ainda assim, a evidência respalda categoricamente o uso da aspirina no contexto da prevenção secundária.

Por outro lado, temos um espectro de pacientes que, apesar dos fatores de risco exibidos, nunca apresentam um evento. Neste grupo a equação risco/benefício é muito mais clara.

Uma recente metanálise (Zheng and Roddick et al) relatou uma significativa redução da morte cardiovascular primária (embora o risco de sangramento maior tenha sido mais alto). Porém, estes dados devem ser colocados sob a lupa e criteriosamente analisados dada a grande quantidade de potenciais elementos de confusão.


Leia também: TAVI em baixo risco em voga em várias publicações.


Esta metanálise talvez tenha estado exposta a falsos positivos (erros tipo 1) e falsos negativos (erros tipo 2) devido ao grande número de testes não significativos e a um escasso poder estatístico (próprio de um estudo não randomizado no qual não se calcula o número necessário de pacientes para demonstrar ou não a hipótese formulada).

A presente metanálise considerou todos estes pontos técnicos que podem levar a uma conclusão completamente diferente da do estudo antes mencionado.

De fato, para a população global, a aspirina não se associa a um benefício na sobrevida (sempre no contexto de prevenção primária).

Além disso, a aspirina se associou a um maior risco de sangramento intracraniano e gastrointestinal na população global.


Leia também: Quando 80 parece o ponto de corte para indicar o TAVI, 90 poderia ser a contraindicação?


Para os diabéticos os resultados não foram concludentes. Esta população teve benefícios mas os mesmos não foram significativos em termos de AVC ou infartos.

Para os pacientes de baixo risco, os resultados demonstram que não existe nenhum benefício na prevenção cardiovascular primária de eventos como morte ou AVC mas sim um incremento dos sangramentos. O risco de sangramento provavelmente anule o benefício isquêmico marginal nesta população.

Na população diabética e também nos que em termos basais tinham maior risco cardiovascular os dados não são concludentes e são necessários mais estudos com o poder estatístico adequado.

Poderíamos concluir que a indicação deve ser feita sob medida para cada paciente balanceando cuidadosamente o risco isquêmico e – mais importante ainda – o risco de sangramento.

Título original: Aspirin for Primary Prevention of Cardiovascular Disease.

Referência: Babikir Kheiri et al. Circ Cardiovasc Qual Outcomes. 2019;12:e005846.


Subscreva-se a nossa newsletter semanal

Receba resumos com os últimos artigos científicos

Sua opinião nos interessa. Pode deixar abaixo seu comentário, reflexão, pergunta ou o que desejar. Será mais que bem-vindo.

Mais artigos deste autor

Doença de tronco da coronária esquerda: ATC guiada por imagens intravasculares vs. cirurgia de revascularização miocárdica

Múltiplos ensaios clínicos randomizados demonstraram resultados superiores da cirurgia de revascularização coronariana (CABG) em comparação com a intervenção coronariana percutânea (ATC) em pacientes com...

AHA 2025 | DAPT-MVD: DAPT estendido vs. aspirina em monoterapia após PCI em doença multivaso

Em pacientes com doença coronariana multivaso que se mantêm estáveis 12 meses depois de uma intervenção coronariana percutânea (PCI) com stent eluidor de fármacos...

AHA 2025 | TUXEDO-2: manejo antiagregante pós-PCI em pacientes diabéticos multivaso — ticagrelor ou prasugrel?

A escolha do inibidor P2Y12 ótimo em pacientes diabéticos com doença multivaso submetidos a intervenção coronariana percutânea (PCI) se impõe como um desafio clínico...

AHA 2025 | DECAF: consumo de café vs. abstinência em pacientes com FA — recorrência ou mito?

A relação entre o consumo de café e as arritmias tem sido objeto de recomendações contraditórias. Existe uma crença estendida de que a cafeína...

LEAVE A REPLY

Please enter your comment!
Please enter your name here

Artigos Relacionados

Congressos SOLACIspot_img

Artigos Recentes

Assista novamente: Embolia Pulmonar em 2025 — Estratificação de Risco e Novas Abordagens Terapêuticas

Já está disponível para assistir o nosso webinar “Embolia Pulmonar em 2025: Estratificação de Risco e Novas Abordagens Terapêuticas”, realizado no dia 25 de...

Um novo paradigma na estenose carotídea assintomática? Resultados unificados do ensaio CREST-2

A estenose carotídea severa assintomática continua sendo um tema de debate diante da otimização do tratamento médico intensivo (TMO) e a disponibilidade de técnicas...

Remodelamento cardíaco após a oclusão percutânea da CIA: imediato ou progressivo?

A comunicação interatrial (CIA) é uma cardiopatia congênita frequente que gera um shunt esquerda-direita, com sobrecarga de cavidades direitas e risco de hipertensão pulmonar...