ACC 2024 | Estudo RELIEVE-HF

A insuficiência cardíaca (IC) se caracteriza por aumentos nas pressões de enchimento do átrio esquerdo (AE) e congestão venosa, fenômenos que se intensificam com o exercício e a sobrecarga de volume, o que dificulta seu manejo com tratamento médico convencional. Em tal contexto, o uso de um shunt interatrial poderia oferecer um mecanismo autorregulador, como ficou evidenciado no estudo Ventura IAS. 

ACC 2024

O objetivo deste estudo foi avaliar a segurança e a efetividade do dispositivo Ventura IAS em pacientes com IC e fração de ejeção ventricular (FE) reduzida ou preservada (HFrEF e HFpEF, respectivamente).

Foram incluídos pacientes com miocardiopatia isquêmica ou não isquêmica e qualquer fração de ejeção com HF documentada dentro dos últimos 6 meses (NYHA II-III ou IV), apesar do tratamento médico óptimo (TMO), e com antecedentes de hospitalização por HF nos anteriores 12 meses e/ou níveis elevados de peptídeo natriurético tipo B (BNP), bem como uma distância percorrida no teste de caminhada de 6 minutos entre 100 e 450 metros. 

Foram excluídos os pacientes com pressão arterial sistólica (PAS) < 90 ou > 160 mmHg, hipertensão grave (pressão sistólica da artéria pulmonar [PSAP] > 70 mmHg ou resistência vascular pulmonar [PVR] >4 unidades Wood) e disfunção do ventrículo direito (VD) com uma velocidade de onda tricúspide (TAPSE) < 12 mm. Também foram excluídos os pacientes com comunicação interatrial (CIA) e forame oval patente (FOP) corrigidos, bem como aqueles com valvopatia severa. 

Leia Também: Tendências temporais no implante percutâneo da valva aórtica para a estenose aórtica grave isolada.

O desfecho de efetividade foi a comparação de grupos da composição hierárquica (mortalidade por qualquer causa, transplante cardíaco, hospitalização por HF, piora de HF ambulatorial e mudança na qualidade de vida segundo o questionário Kansas City Cardiomyopathy Questionnaire [KCCQ]). Os desfechos de segurança incluíram eventos adversos cardiovasculares maiores não fatais relacionados com o dispositivo (MACNE), como acidente vascular cerebral, embolia sistêmica, necessidade de cirurgia aberta ou complicações endovasculares maiores, tudo isso dentro dos 30 dias posteriores ao procedimento. 

Foram randomizados 508 pacientes em uma proporção 1:1 entre o grupo de tratamento com dispositivo de shunt interatrial (n = 250) e o grupo placebo (n = 258), estratificados segundo a EF, com um seguimento médio de 22 meses. A idade média foi de 74 anos, 64,8% da população estava composta por homens, 49,6% tinha diabetes e a etiologia predominante era não isquêmica (54,5%), com uma maioria de pacientes com FE preservada (59,6%) e a grande maioria (95,6%) em classe funcional III. 

No tocante à segurança, não foram observados eventos MACNE dentro dos primeiros 30 dias do procedimento (p < 0,0001). Quanto à efetividade, não foi observada diferença significativa no desfecho primário composto (análise interina), com um índice de Win Ratio de 0,86 (0,61-1,22; p = 0,20). No entanto, ao analisar os subgrupos segundo a EF, observou-se uma redução significativa no índice de eventos em pacientes com HFrEF (razão de taxa relativa 0,55; p < 0,0001), ao passo que naqueles com HFpEF observou-se um aumento no mesmo índice (razão de taxa relativa 1,68; p = 0,001). 

Leia Também: Litotripcia no “Mundo Real”: Estudo REPLICA EPIC-18.

Conclusão dos autores: o implante transcateter do dispositivo de shunt interatrial Ventura foi seguro, não demonstrando, no entanto, uma redução significativa nos sintomas nem uma melhora no prognóstico de pacientes com insuficiência cardíaca em geral. Os resultados estratificados sugerem um possível benefício em pacientes com HFrEF e um possível dano naqueles com HFpEF.

Dr. Omar Tupayachi

Dr. Omar Tupayachi.
Membro do Conselho Editorial da SOLACI.org.

Título Original: Shunt Interatrial em pacientes com HFrEF e HFpEF. 

Referência: Apresentado pelo Dr. Gregg Stone no ACC.24 Late-Breaking Clinical Trials, 6-8 de abril, Atlanta.


Subscreva-se a nossa newsletter semanal

Receba resumos com os últimos artigos científicos

Mais artigos deste autor

Subexpansão da ACURATE Neo2: prevalência e implicações clínicas

O implante percutâneo da valva aórtica (TAVI), para além de ter demonstrado benefícios clínicos sustentáveis em diversas populações de pacientes, ainda enfrenta alguns desafios...

Gradientes pós-TAVI e as consequências de sua mensuração: são equiparáveis a medição invasiva e a ecográfica?

O implante percutâneo da valva aórtica (TAVI) é considerado o tratamento de escolha em uma porcentagem significativa de pacientes com estenose aórtica sintomática. Seus...

Implante valvar percutâneo da valva tricúspide. Lux-Valve

A insuficiência tricúspide (IT) é uma entidade que se associa a uma má qualidade de vida, frequentes hospitalizações por insuficiência cardíaca e um aumento...

TAVI em anel pequeno: que válvula devemos utilizar?

Um dos principais desafios na estenose aórtica severa são os pacientes que apresentam anéis valvares pequenos, definidos por uma área ≤ 430 mm². Esta...

LEAVE A REPLY

Please enter your comment!
Please enter your name here

Artigos Relacionados

Congressos SOLACIspot_img

Artigos Recentes

Tabagismo e seu impacto na doença cardiovascular 10 anos depois de uma angioplastia coronariana

O tabagismo é um fator de risco bem estabelecido para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares ateroscleróticas. Alguns relatórios históricos sugeriram, no entanto, um menor...

Subexpansão da ACURATE Neo2: prevalência e implicações clínicas

O implante percutâneo da valva aórtica (TAVI), para além de ter demonstrado benefícios clínicos sustentáveis em diversas populações de pacientes, ainda enfrenta alguns desafios...

Jejum vs. não jejum antes de procedimentos cardiovasculares percutâneos

Embora em 2017 as diretrizes da Sociedade Americana de Anestesiologistas tenham sido atualizadas para permitir a ingestão de líquidos claros até duas horas e...