Subexpansão da ACURATE Neo2: prevalência e implicações clínicas

O implante percutâneo da valva aórtica (TAVI), para além de ter demonstrado benefícios clínicos sustentáveis em diversas populações de pacientes, ainda enfrenta alguns desafios técnicos que poderiam impactar em sua durabilidade. Uma das limitações da técnica poderia ser a subexpansão do stent protético, particularmente em seu segmento médio (ou midframe), uma situação até agora pouco caracterizada. 

Kim et al. realizaram um estudo em que analisaram retrospectivamente 604 pacientes consecutivos tratados com a válvula autoexpansível ACURATE neo2 em dois centros europeus de alto volume. O objetivo foi avaliar a incidência, os preditores e a relevância clínica da subexpansão da estrutura média (midframe underexpansion).

A subexpansão foi definida como a “não paralelização de duas das três colunas comissurais”, medida mediante um Δ-Post avaliado por fluoroscopia pós-implante. utilizou-se como ponto de corte uma diferença entre colunas (Δ-Post ≥1 mm), com base em testes bench-testing e hidrodinâmicos.

O desfecho primário foi uma combinação de morte por qualquer causa, acidente vascular cerebral (AVC) ou re-hospitalização relacionada com a válvula durante o primeiro ano. 

Após o TAVI, o Δ-Post médio foi de 0,5 mm, sendo significativamente maior no grupo midframe subexpandido (1,5 mm vs. 0,5 mm; p < 0,001). A subexpansão do segmento médio foi identificada em 13,9% dos casos, associando-se de forma independente a um maior risco de desfecho primário (39,3%; IC de 95%: 28,8%-50,5% vs. 10,4%; IC de 95%: 7,9%-13,3%; p < 0,001) e inclusive de mortalidade total (HR ajustado: 4,07). Outros preditores independentes foram os gradientes basais transtorácicos baixos, a alteração da função renal e o desalinhamento comissural. 

Leia também: Dissecção espontânea do tronco da coronária esquerda: características clínicas, manejo e resultados.

Cabe destacar que a única variável preditora da subexpansão foi a ausência de pós-dilatação (OR ajustado: 5,6), que demonstrou reduzir de maneira significativa tanto a prevalência quanto o grau de deformidade do segmento. A severidade do cálcio valvar mostrou inicialmente uma relação com a subexpansão, mas não manteve significância estatística na avaliação final depois de realizada a pós-dilatação. 

Conclusões

Este estudo demonstra que a subexpansão do segmento médio, embora pouco frequente, se associa a uma clara deterioração clínica em um ano. A pós-dilatação, quando realizada, é efetiva para reduzir a incidência e extensão da subexpansão do midframe. É fundamental confirmar estes achados com mais estudos e não usar como referência unicamente os resultados retrospectivos apresentados pelos autores. 

Título original: Clinical Impact of Midframe Underexpansion Following TAVR Using a Self-Expanding Transcatheter Heart Valve.

Referência: Kim, W, de Backer, O, Renker, M. et al. Clinical Impact of Midframe Underexpansion Following TAVR Using a Self-Expanding Transcatheter Heart Valve. J Am Coll Cardiol Intv. 2025 Apr, 18 (8) 1028–1041. https://doi.org/10.1016/j.jcin.2025.02.013.


Subscreva-se a nossa newsletter semanal

Receba resumos com os últimos artigos científicos

Dr. Omar Tupayachi
Dr. Omar Tupayachi
Membro do Conselho Editorial do solaci.org

Mais artigos deste autor

Remodelamento cardíaco após a oclusão percutânea da CIA: imediato ou progressivo?

A comunicação interatrial (CIA) é uma cardiopatia congênita frequente que gera um shunt esquerda-direita, com sobrecarga de cavidades direitas e risco de hipertensão pulmonar...

É realmente necessário monitorar todos os pacientes após o TAVI?

Os distúrbios de condução (DC) posteriores ao implante percutâneo da valva aórtica (TAVI) constituem uma complicação frequente e podem incidir na necessidade de um...

Valvoplastia aórtica radial: vale a pena ser minimalista?

A valvoplastia aórtica com balão (BAV) foi historicamente empregada como estratégia de “ponte”, ferramenta de avaliação ou inclusive tratamento paliativo em pacientes com estenose...

Fibrilação atrial após oclusão percutânea do forame oval patente: estudo de coorte com monitoramento cardíaco implantável contínuo

A fibrilação atrial (FA) é uma complicação bem conhecida após a oclusão do forame oval patente (FOP), com incidência relatada de até 30% durante...

LEAVE A REPLY

Please enter your comment!
Please enter your name here

Artigos Relacionados

Congressos SOLACIspot_img

Artigos Recentes

Assista novamente: Embolia Pulmonar em 2025 — Estratificação de Risco e Novas Abordagens Terapêuticas

Já está disponível para assistir o nosso webinar “Embolia Pulmonar em 2025: Estratificação de Risco e Novas Abordagens Terapêuticas”, realizado no dia 25 de...

Um novo paradigma na estenose carotídea assintomática? Resultados unificados do ensaio CREST-2

A estenose carotídea severa assintomática continua sendo um tema de debate diante da otimização do tratamento médico intensivo (TMO) e a disponibilidade de técnicas...

Remodelamento cardíaco após a oclusão percutânea da CIA: imediato ou progressivo?

A comunicação interatrial (CIA) é uma cardiopatia congênita frequente que gera um shunt esquerda-direita, com sobrecarga de cavidades direitas e risco de hipertensão pulmonar...