O ECMO-VA periférico se consolidou globalmente como um dos suportes circulatórios mais utilizados em pacientes com choque cardiogênico (CC) refratário ao tratamento médico ótimo. No entanto, os ensaios clínicos randomizados mais recentes não demonstraram um benefício na sobrevivência em populações não selecionadas. Por isso, a correta identificação do fenótipo de paciente crítico que poderia se beneficiar com essa estratégia é fundamental.

A partir desse ponto de vista fisiológico, os fluxos altos em ECMO-VA periférico costumam se associar com distensão do ventrículo esquerdo (VE) e aumento de suas pressões de enchimento (pressão capilar pulmonar ou POAP), consequência do fluxo retrógrado, o que incrementa o risco de edema pulmonar. Por tal motivo, especialistas recomendam empregar o menor fluxo necessário que assegure uma adequada perfusão.
Em dito contexto, o grupo do PAPO-Flow Study buscou determinar o que ocorre realmente ao incrementar o fluxo, aplicando um protocolo de aumentos graduais e realizando medições invasivas e não invasivas.
Tratou-se de um estudo unicêntrico (Hôpital Pitié-Salpêtrière, Paris, França) que incluiu 80 pacientes em CC, todos monitorados com cateter de artéria pulmonar (CAP ou Swan-Ganz) e submetidos a um protocolo randomizado de mudanças de fluxos entre 2 e 4 L/min durante as primeiras 48 horas. O resto das medidas terapêuticas (inotrópicos, ventilação, sedação) se mantiveram constantes. Em pacientes com balão de contrapulsação intra-aórtico (BCIAo), este foi retirado antes do início do protocolo.
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As características basais mostraram uma idade média de 49 anos, com 80% de homens, um escore SOFA médio de 55, a maioria classificados com SCAI tipo D, escore inotrópico de 20; 25% eram pós-parada e 11% precisou de canulação intraparada.
No tocante aos resultados, esperava-se que o aumento do fluxo incrementasse a pós-carga e, com isso, a PAOP. A PAOP basal média foi de 15 mmHg (somente um terço ≥ 18 mmHg). Ao incrementar o fluxo, 36% dos pacientes apresentaram uma queda ≥ 20% na POAP, 58% permaneceram estáveis e apenas 6% mostraram um aumento. Em conjunto, a tendência global foi a uma leve redução da pressão de oclusão da artéria pulmonar (de 15 a 14 mmHg; p = 0,003).
Este efeito veio acompanhado de uma diminuição no diâmetro telessistólico do VE, do VTE aórtico e do índice de volume sistólico, sem mudanças significativas na fração de ejeção (FEVE). O índice cardíaco se reduziu (de 2,4 para 2,1 L/min/m²; p < 0,01), embora o trabalho miocárdico esquerdo tenha se mantido estável. Do lado direito, a pressão venosa central (PVC) desceu e o acoplamento VD-artéria pulmonar melhorou (FAC/PAPs; p < 0,01).
O mecanismo proposto pelos autores sugere que o aumento da pós-carga do VE se balanceia com a redução da pré-carga direita, o que diminui o fluxo pulmonar. Nesse equilíbrio, a POAP não se eleva como tradicionalmente se pensava.
Os preditores de redução de POAP foram: melhor função biventricular, pressão arterial média mais elevada no início e PVC mais baixa. Na análise exploratória, os pacientes com queda de POAP apresentaram uma maior sobrevivência em UTI (24% vs. 57%; HR 0,45; IC de 95%: 0,22–0,92).
Conclusões
Este estudo questiona a visão clássica dos efeitos hemodinâmicos adversos do fluxo retrógrado em ECMO-VA e ressalta que a resposta ao fluxo depende de um balanço dinâmico entre a pré-carga e a pós-carga biventricular. O ajuste individualizado do fluxo poderia evitar intervenções desnecessárias (como o venting sistemático) e o uso do CAP teria potencial para melhorar a identificação de pacientes respondedores.
Título original: Effect of ECMO Flow Variations on Pulmonary Capillary Wedge Pressure in Patients With Cardiogenic Shock.
Referência: Saura, O, Hékimian, G, Del Marmol, G. et al. Effect of ECMO Flow Variations on Pulmonary Capillary Wedge Pressure in Patients With Cardiogenic Shock. JACC. 2025 Sep, 86 (11) 768–778. https://doi.org/10.1016/j.jacc.2025.06.048.
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