Mortalidade e sangramento na escolha do acesso: revisão sistemática

Em 1992, Kiemeneij realizou o primeiro procedimento coronariano por via radial, depois da descrição do acesso feita por Campeau em 1989. 30 anos transcorreram desde esse acontecimento na cardiologia intervencionista. Ao longo dos anos a quantidade de procedimentos realizados por essa via vem aumentando exponencialmente, sendo hoje a principal abordagem na maioria dos centros, nos distintos cenários clínicos. 

Mortalidad y sangrado en la elección del acceso: revisión sistemática

Historicamente a abordagem transradial (TRA) se associou com menor índice de sangramento relacionado com o acesso e complicações vasculares em comparação com a abordagem transfemoral (TFA). No entanto, em alguns estudos ditos resultados não foram concludentes. 

Gargiulo et al. apresentaram recentemente no Congresso Europeu de Cardiologia a primeira grande metanálise de um conjunto de dados de pacientes individuais de estudos randomizados de alta qualidade (diferentemente das metanálise dos estudos). O objetivo do trabalho foi comparar a abordagem TRA com a TFA entre pacientes submetidos a somente uma cinecoronariografia ou esta mais uma angioplastia, com o fim de averiguar se a escolha do método de abordagem gera mudanças em termos de mortalidade ou sangramento. 

Foi feita uma busca nas bases de dados MELINE, EMBASE, Cochrane, entre outras. O desfecho primário foi a mortalidade por todas as causas em 30 dias, o desfecho coprimário foi o sangramento em 30 dias. Os desfechos secundários incluíram o sangramento BARC, sangramento TIMI relacionado com a cirurgia de revascularização miocárdica, necessidade de transfusão e trombose do stent. Finalmente foi avaliada a presença da combinação de eventos cardiovasculares maiores (MACCE) e a combinação de ventos clínicos puros (NACE) em 30 dias. 

Foi feita uma triagem de 1499 consultas, dentre as quais 22 eram potencialmente elegíveis para posterior análise de 7 estudos randomizados, incluindo-se nestes os dados individuais de cada paciente. 

Foram obtidos dados de 21.600 pacientes, 49,9% randomizados a TRA e 50,1% a TFA. A idade média foi de 63,9 anos, 31,9% da população estava composta de mulheres e a apresentação clínica era predominantemente aguda (SCASEST 48,6% e SCACEST 46,2%). A angioplastia foi realizada em 75,2% das intervenções. 

Observou-se uma diminuição da mortalidade por todas as causas com a abordagem TRA em comparação com a TFA em 30 dias (HR 0,77; IC 95% 0,63-0,95; p = 0,012). Ao analisar o subgrupo de pacientes com hemoglobina < 11g/dl observou-se uma diminuição mais significativa (HR 0,35, IC 95% 0,20-0,61; p < 0,001).

O sangramento maior foi menor no grupo TRA em 30 dias (OR 0,55, IC 95% 0,45-0,67; p < 0,001), benefício que se evidenciou em todas as definições de sangramento usadas. 

Ao analisar a combinação de MACCE, observou-se que a abordagem TRA apresentou menos eventos (0,89; IC 95% 0,79-1,0; p = 0,047). Com relação ao NACE também foram observados menos eventos (OR 0,80, IC 95% 0,72-0,89; p < 0,001).

Conclusões

Os resultados desta metanálise de dados de pacientes individuais evidenciou com uma boa margem de certeza que a abordagem transradial se associou com menor mortalidade e menores índices de sangramento, o que por sua vez diminui os MACCE e NACE em 30 dias. Por outro lado, o risco de AVC, IAM ou trombose do stent não se viu alterado. Esses dados podem ser extrapolados e validados para a população com síndrome coronariana aguda que representam 95 dos pacientes incluídos. 

Dr. Omar Tupayachi

Dr. Omar Tupayachi.
Membro do Conselho Editorial da SOLACI.org.

Título Original: Impact on Mortality and Major Bleeding of Radial Versus Femoral Artery Access for Coronary Angiography or Percutaneous Coronary Intervention: a Meta-analysis of Individual Patient Data From Seven Multicenter Randomized Clinical Trials.

Fonte: Gargiulo, Giuseppe et al. “Impact on Mortality and Major Bleeding of Radial Versus Femoral Artery Access for Coronary Angiography or Percutaneous Coronary Intervention: a Meta-analysis of Individual Patient Data from Seven Multicenter Randomized Clinical Trials.” Circulation, 10.1161/CIRCULATIONAHA.122.061527. 29 Aug. 2022.


Subscreva-se a nossa newsletter semanal

Receba resumos com os últimos artigos científicos

Mais artigos deste autor

COILSEAL: Utilização de coils na angioplastia coronariana: uma ferramenta de valor nas complicações?

A utilização de coils como ferramenta de oclusão vascular tem experimentado uma expansão progressiva, partindo de seu uso tradicional em neurorradiologia até incorporar-se ao...

Tratamento da reestenose intrastent em vasos pequenos com balões recobertos de paclitaxel

A doença arterial coronariana (DAC) em vasos epicárdicos de menor calibre se apresenta em 30% a 67% dos pacientes submetidos a intervenção coronariana percutânea...

Perfurações coronarianas e o uso de stents recobertos: uma estratégia segura e eficaz a longo prazo?

As perfurações coronarianas continuam sendo uma das complicações mais graves do intervencionismo coronariano (PCI), especialmente nos casos de rupturas tipo Ellis III. Diante dessas...

Doença de tronco da coronária esquerda: ATC guiada por imagens intravasculares vs. cirurgia de revascularização miocárdica

Múltiplos ensaios clínicos randomizados demonstraram resultados superiores da cirurgia de revascularização coronariana (CABG) em comparação com a intervenção coronariana percutânea (ATC) em pacientes com...

LEAVE A REPLY

Please enter your comment!
Please enter your name here

Artigos Relacionados

Congressos SOLACIspot_img

Artigos Recentes

COILSEAL: Utilização de coils na angioplastia coronariana: uma ferramenta de valor nas complicações?

A utilização de coils como ferramenta de oclusão vascular tem experimentado uma expansão progressiva, partindo de seu uso tradicional em neurorradiologia até incorporar-se ao...

Tratamento da reestenose intrastent em vasos pequenos com balões recobertos de paclitaxel

A doença arterial coronariana (DAC) em vasos epicárdicos de menor calibre se apresenta em 30% a 67% dos pacientes submetidos a intervenção coronariana percutânea...

Desafios contemporâneos na oclusão do apêndice atrial esquerdo: enfoque atualizado sobre a embolização do dispositivo

Embora a oclusão percutânea do apêndice atrial esquerdo seja, em geral, um procedimento seguro, a embolização do dispositivo – com uma incidência global de...