Prevenção secundária: uma responsabilidade que não deveríamos delegar

Após uma angioplastia coronariana o uso de fármacos de comprovada eficácia na redução de eventos maiores vai declinando com o tempo, o que se relaciona com um pior prognóstico para nossos pacientes. 

Pretratamiento con estatinas para prevenir eventos peri angioplastia carotidea

Às vezes, sem querer, podemos transmitir a sensação aos pacientes de que depois do implante do stent a artéria está “curada” ou que o único problema a futuro é uma eventual reestenose. Tal sensação de estar “curados” é, obviamente, falsa, mas a realidade é que nenhum trabalho fez um seguimento a longo prazo dos pacientes após uma angioplastia para provar isso com números concretos. 

O presente estudo recentemente publicado no Circ. Cardiovasc. Qual. Outcomes se ocupou da prevenção secundária para poder lançar luz sobre a aderência dos pacientes após uma angioplastia coronariana e seu eventual impacto no prognóstico. 

Foram identificados 57.900 pacientes que receberam angioplastia entre 2005 e 2014 nos quais se investigou a utilização de estatinas, betabloqueadores, inibidores da enzima de conversão/bloqueadores do receptor da angiotensina e inibidores do receptor P2Y12. Estas medicações foram registradas tanto no momento da alta hospitalar como em 6 meses, 1 ano, 3 anos e 5 anos pós-angioplastia. 


Leia também: ESC 2018 | ARRIVE: a aspirina no olho da tormenta da prevenção primária.


No momento da alta, somente um pouco mais da metade dos pacientes (58,3%) saiu recebendo toda a medicamentação. A indicação, no momento da alta, de estatinas, betabloqueadores e inibidores da enzima de conversão/bloqueadores do receptor de angiotensina caíram de 89%, 84,9% e 72,2% a 72,7%, 67,9% e 57,9%, respectivamente em 5 anos. 

A prescrição de inibidores do receptor P2Y12 caiu de 96,5% no momento da alta a 28,3% em 5 anos, com uma clara redução um ano após o procedimento. 

O uso de cada classe de medicamento e suas combinações se relacionou com uma redução significativa da taxa de eventos maiores (morte, infarto, AVC ou revascularização repetida). 


Leia também: A aspirina em prevenção primária: outra “tendência na moda” nas publicações.


De todas as drogas, as estatinas foram as que geraram maior impacto (HR: 0,77; IC 95%: 0,75–0,79; p < 0,0001) seguida dos inibidores do receptor P2Y12 (HR: 0,82; IC 95%: 0,79–0,85; p < 0,0001).

Algo que também chama a atenção é a alta taxa de novas revascularizações naqueles pacientes que continuaram recebendo todas as drogas até os 5 anos. Isso poderia ser explicado de várias maneiras: 1) aqueles que mantiveram todo o tratamento medicamentoso são os que mais frequentemente se submeteram aos controles e, portanto, detectaram muitas reestenoses clinicamente silentes, e 2) aqueles que continuaram recebendo todos os medicamentos também poderiam refletir um grupo com anatomia mais complexas e doença de múltiplos vasos. 

Esta evidência é retrospectiva e com múltiplas limitações metodológicas, mas não pode passar despercebida. A prevenção secundária não só é responsabilidade dos cardiologistas clínicos mas também dos intervencionistas. 

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Título original: Medical Therapy Utilization and Long-Term Outcomes Following Percutaneous Coronary Intervention. Five-Year Results From the Veterans Affairs Clinical Assessment, Reporting, and Tracking System Program.

Referência: Joe X. Xie et al. Circ Cardiovasc Qual Outcomes. 2019;12:e005455.


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