Estenose aórtica com baixo gradiente e fluxo normal: mudanças na qualidade de vida com TAVI

O tratamento recomendado para a estenose severa sintomática não é motivo de discussão, já que tanto o implante percutâneo da valva aórtica (TAVI) como a substituição cirúrgica demonstraram uma mudança significativa em termos de prognóstico. Embora exista certa ambiguidade em sua caracterização, o que se busca definir são os perfis hemodinâmicos de severidade. Tais perfis foram classificados como estenose aórtica de alto gradiente (AG EA), baixo gradiente e baixo fluxo (BG BF) com fração de ejeção (Fej) reduzida, e BF BG com Fej preservada (subtipo paradoxal). 

Estenosis aórtica bajo gradiente y flujo normal: Cambios en la calidad de vida con TAVI

Dentre os pacientes com Fej preservada, um subtipo considerável de 15% apresenta BG e fluxo normal (FN BG), definido este como um índice de volume sistólico (SVi) ≥ 35mm por m2. Neste subtipo não há consenso sobre o momento adequado para o tratamento. A evidência atual é discordante em tal sentido, com estudos observacionais que favorecem o tratamento médico por sobre a intervenção e que assinalam um prognóstico desfavorável, como evidenciam registros que mostram uma maior mortalidade nesse grupo em comparação com a estenose aórtica moderada. 

Devido a limitações na correta observação da área valvar (AVA), há discrepância ao escolher os limiares de severidade. Apesar de os pacientes FN BG apresentarem gradientes reduzidos, a severidade da estenose poderia ser subestimada. Isso se deve ao fato de, em média, uma AVA de 1,0 cm2 determinada por ecocardiografia corresponder a um gradiente médio de 28 mmHg em vez de 40 mmHg em condições de fluxo normal. 

Os pacientes FN BG representam um grupo heterogêneo o qual, por consenso, se decidiu tratar e até mesmo incluir em ensaios. Contudo, os guias atuais não os contemplam. O objetivo deste estudo foi comparar mudanças na qualidade de vida (QoL) e na melhora clínica dos pacientes FN BG tratados com TAVI. 

Leia também: Balões recobertos de fármacos (DCB): sirolimus vs. paclitaxel em lesões de novo em vasos pequenos.

Foram incluídos pacientes consecutivos submetidos a TAVI por estenose aórtica severa durante um período de 8 anos na Universidade de Michigan, excluindo aqueles com insuficiência aórtica moderada-severa. Fez-se uma estratificação em quatro perfis hemodinâmicos: 1) Estenose clássica com alto gradiente (EAo AG velocidade pico ≥ 4,0 m/s ou GM ≥ 40 mmHg), 2) BF-BG clássica (VP < 4,0 m/s e GM < 40 mmHg, com AVA < 1 com una Fej < 50%), 3) BF-BG paradoxal (VP < 4,0 m/s e GM < 40 mmHg, com AVA < 1 com uma Fej ≥ 50% e SVi < 35 mL/m2) e FN-BG (VP < 4,0 m/s e GM < 40 mmHg, com AVA < 1 com uma Fej ≥ 50% e SVi ≥ 35 mL/m2). Foi avaliado um desfecho composto de melhora clínica que consistia na sobrevida em um ano e na melhora clínica de QoL conforme o escore KCCQ. 

Um total de 860 pacientes foram incluídos na análise, dentre os quais 42,8% apresentaram EAo AG e 28,5% apresentaram FN BG. Os pacientes com FN BG eram mais velhos e apresentavam uma maior prevalência de infarto agudo do miocárdio. A grande maioria foi submetida a TAVI com plataforma autoexpansível (86,6%) e foram observados índices similares de implante de marca-passo e de insuficiência aórtica pós-procedimento. Os FN BG apresentaram um gradiente aórtico médio menor que os EAo AG clássicos no seguimento de 30 dias (7,8 vs. 9,9 mmHg, respectivamente; p < 0,001).

Ao avaliar a mortalidade total, 10% dos pacientes faleceu dentro do primeiro ano. O índice de mortalidade em um ano foi maior no grupo FN BG (11,8%) do que no grupo AG (6,2%; p = 0,001). Observou-se uma tendência significativa de mortalidade precoce durante todo o primeiro ano de seguimento (log-rank P = 0,003).

Leia também: Cilostazol em pacientes diabéticos com revascularização periférica endovascular: um passo para além da melhora sintomática.

Ao analisar a qualidade de vida, os quatro grupos mostraram uma melhora significativa com a intervenção valvar percutânea em comparação com o estado basal. Tanto o grupo EAo AG quanto o FN BG demonstraram um incremento similar (21,4 vs. 20,8, respectivamente; p = 0,44). A melhora clínica (DP) foi alcançada em 63,9% dos pacientes com FN normal em comparação com 70,4% dos pacientes com AG. Ao realizar o ajuste primário, observou-se que os índices de DP não foram significativamente diferentes, mostrando uma tendência a piores desfechos de QoL no grupo FN. 

Conclusões

Neste estudo unicêntrico que avaliou a QoL posterior ao TAVI em pacientes com FN, observou-se uma melhora clínica similar ao comparar ditos pacientes com outros perfis hemodinâmicos. No entanto, é importante destacar a mortalidade precoce dos pacientes com fluxo normal, o que deveria motivar novas investigações e avaliar a detecção mais fidedigna neste subtipo. 

Dr. Andrés Rodríguez

Dr. Andrés Rodríguez.
Membro do Conselho Editorial da SOLACI.org.

Título Original: Quality of Life After Transcatheter Aortic Valve Replacement in Normal-Flow, Low-Gradient Aortic Stenosis.

Referência: Khaleel, I, Harris, A, Seth, M. et al. Quality of Life After Transcatheter Aortic Valve Replacement in Normal-Flow, Low-Gradient Aortic Stenosis. JACC Adv. 2023 Nov, 2 (9). https://doi.org/10.1016/j.jacadv.2023.100641.


Subscreva-se a nossa newsletter semanal

Receba resumos com os últimos artigos científicos

Mais artigos deste autor

Remodelamento cardíaco após a oclusão percutânea da CIA: imediato ou progressivo?

A comunicação interatrial (CIA) é uma cardiopatia congênita frequente que gera um shunt esquerda-direita, com sobrecarga de cavidades direitas e risco de hipertensão pulmonar...

É realmente necessário monitorar todos os pacientes após o TAVI?

Os distúrbios de condução (DC) posteriores ao implante percutâneo da valva aórtica (TAVI) constituem uma complicação frequente e podem incidir na necessidade de um...

Valvoplastia aórtica radial: vale a pena ser minimalista?

A valvoplastia aórtica com balão (BAV) foi historicamente empregada como estratégia de “ponte”, ferramenta de avaliação ou inclusive tratamento paliativo em pacientes com estenose...

Fibrilação atrial após oclusão percutânea do forame oval patente: estudo de coorte com monitoramento cardíaco implantável contínuo

A fibrilação atrial (FA) é uma complicação bem conhecida após a oclusão do forame oval patente (FOP), com incidência relatada de até 30% durante...

LEAVE A REPLY

Please enter your comment!
Please enter your name here

Artigos Relacionados

Congressos SOLACIspot_img

Artigos Recentes

Assista novamente: Embolia Pulmonar em 2025 — Estratificação de Risco e Novas Abordagens Terapêuticas

Já está disponível para assistir o nosso webinar “Embolia Pulmonar em 2025: Estratificação de Risco e Novas Abordagens Terapêuticas”, realizado no dia 25 de...

Um novo paradigma na estenose carotídea assintomática? Resultados unificados do ensaio CREST-2

A estenose carotídea severa assintomática continua sendo um tema de debate diante da otimização do tratamento médico intensivo (TMO) e a disponibilidade de técnicas...

Remodelamento cardíaco após a oclusão percutânea da CIA: imediato ou progressivo?

A comunicação interatrial (CIA) é uma cardiopatia congênita frequente que gera um shunt esquerda-direita, com sobrecarga de cavidades direitas e risco de hipertensão pulmonar...