Entre 30% e 70% dos pacientes submetidos implante percutâneo da valva aórtica (TAVI) apresentam doença coronariana (DC). No entanto, o impacto prognóstico da DC no contexto do TAVI não está completamente esclarecido. Embora tenha sido demonstrado que a DC aumenta a mortalidade no seguimento de um ano após a realização do TAVI, o efeito da angioplastia coronariana transluminal percutânea (ATC) antes, durante ou depois do procedimento continua sendo incerto.
O estudo ACTIVATION (Intervenção Coronariana Percutânea prévia ao implante percutâneo da valva aórtica) não conseguiu demonstrar a não inferioridade da ATC comparada ao tratamento médico no que se refere à mortalidade pós-TAVI. Além disso, a revascularização posterior pode ser ainda mais controversa, já que o acesso coronariano se torna mais complexo.
A incidência de síndrome coronariana aguda (SCA) em 2 anos parece ser também muito baixa, ocorrendo entre 5% e 10% dos casos. O acesso coronariano após um TAVI é mais complexo, especialmente com válvulas autoexpansíveis (VET) em comparação com as válvulas expansíveis por balão (VEB) devido a seu design. Apesar de dita dificuldade, conseguiu-se, em centros com experiência, uma taxa de canulação seletiva para angiografia coronariana (AC) de 99% para VEB e de 89% para VET, segundo o estudo RE-ACCESS (Reobtain Coronary Ostia Cannulation Beyond Transcatheter Aortic Valve Stent).
Os dados que predizem a necessidade de ATC e os fatores que influem no manejo da DC depois de um TAVI continuam sendo limitados.
O objetivo deste estudo foi avaliar a incidência e os fatores preditivos da DC após o TAVI, bem como seu impacto prognóstico na mortalidade, na hospitalização por insuficiência cardíaca (IC) e na combinação de ambos utilizando o registro France-TAVI (Registro de Biopróteses Valvulares Aórticas Estabelecidas por Cateter). Também foi analisado o impacto do design valvular (VEB vs. VET) e o efeito de o tratamento se dar em um centro com ou sem capacidade de realizar TAVI sobre os resultados a longo prazo.
Leia também: Angiografia coronariana não planejada após o TAVI: incidência, preditores e resultados.
O desfecho primário (DP) foi a taxa de primeira hospitalização por DC durante o seguimento. O desfecho secundário (DS) foi a combinação de mortalidade por qualquer causa ou hospitalização por IC após DC.
Resultados
Foram incluídos, entre 2013 E 2021, 64.660 pacientes (63,8 VET e 36,2 VEB) com um seguimento aproximado de 8 anos. A idade média foi de 84 anos e a maioria dos pacientes eram homens, com um Euroscore log médio de 12%. O acesso femoral foi o mais utilizado. Entre as próteses empregadas, a SAPIEN 3 foi a mais utilizada no grupo VEB, ao passo que a Evolut R foi a mais frequente no grupo VET.
Observou-se DC em 11,6% dos casos (1,5% anual). Os principais preditores de DC após a alta foram: sexo masculino, menor idade, dislipidemia, antecedentes de DC, doença vascular periférica, estenose coronariana > 50% prévia ao TAVI e infarto agudo do miocárdio com elevação do ST (IAMCEST) durante a hospitalização por TAVI.
No tocante ao DP, os pacientes com VEB apresentaram uma incidência de 12% em comparação com 10,9% do grupo VET (p = 0,04). Após a DC, os resultados combinados foram melhores nos pacientes submetidos a ATC do que naqueles que foram submetidos somente a angiografia coronariana ou nenhuma intervenção (79,6%, 85,2% e 86,5%, respectivamente; p = 0,002). Os eventos adversos também foram mais frequentes em pacientes com VEB do que naqueles com VET (85,8% vs. 83,6%; p = 0,01). Os pacientes tratados em centros com capacidade para realizar TAVI tiveram maior probabilidade de serem submetidos a ATC (OR: 1,20 [IC 95%: 1,01-1,42]; p = 0,04), especialmente nos casos em que tinham uma VEB (OR: 1,42 [IC 95%: 1,18-1,71]; p = 0,002).
Conclusão
A incidência anual de DC após um TAVI é baixa (1,5%), mas tem um impacto significativo nos resultados a longo prazo. Os pacientes com VET apresentam maior mortalidade por qualquer causa ou re-hospitalização por IC em 8 anos e são menos propensos a serem submetidos a ATC em centros sem capacidade para TAVI. O tratamento médico exclusivo para a DC se associa com um pior prognóstico, independentemente do tipo de prótese utilizada.
Embora a necessidade de ATC continue sendo relativamente baixa após um TAVI, a otimização do design da válvula para facilitar o acesso coronariano, a implementação de técnicas avançadas e o intercâmbio de conhecimentos em centros especializados continuam sendo fundamentais para melhorar os resultados clínicos.
Título Original: Coronary Events After Transcatheter Aortic Valve Replacement Insights From the France TAVI Registry.
Referência: Sandra Zendjebil, MD et al JACC Cardiovasc Interv. 2025; 18: 229–243.
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