Os fenômenos agudos relacionados com a patologia cardiovascular (CV) com frequência se manifestam como uma consequência do inadequado controle dos fatores de risco ao longo do tempo. A detecção precoce dos pacientes, especialmente os de alto risco, tem contribuído para reduzir de forma significativa a comorbidade relacionada com esses casos.
A calcificação das artérias coronarianas (CAC) é considerada uma medida da carga de aterosclerose nos pacientes e pode estar presente em indivíduos assintomáticos. A quantificação da CAC mediante um cálculo do escore de cálcio costuma ser feita de forma seletiva para melhorar a visualização das coronárias. Na maioria dos centros, esta análise não é feita de forma rotineira, a menos que seja especificamente solicitada. No entanto, a realização de tomografias (TC) não programadas por razões distintas da do diagnóstico cardiovascular pode revelar a presença de calcificações, inclusive não sendo esse o seu objetivo principal.
A inteligência artificial (IA) tem demonstrado ser uma ferramenta valiosa na análise de imagens médicas, desempenhando um papel importante na crivagem. Um grupo de pesquisados de Stanford desenvolveu um algoritmo de deep learning (DL) que utiliza IA para quantificar a CAC incidental em TC de tórax não programadas.
O propósito deste estudo é avaliar se a presença de CAC em uma população previamente sem diagnóstico de doença cardiovascular (excluindo-se os pacientes com angioplastias, cirurgia de bypass ou doença cerebrovascular) se relaciona com a predição de eventos como a mortalidade ou eventos cardiovasculares maiores (MACE).
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Analisaram-se imagens do Stanford Health Care System tomadas entre 2014 e 2019, nas quais a indicação principal da TC foi a detecção de anormalidades em outros estudos pulmonares em 85% dos casos. O algoritmo DL foi validado externamente em seis centros e demonstrou um valor preditivo positivo de 93,5% e uma sensibilidade de 95%. Os resultados avaliados incluíram a mortalidade como desfecho primário e uma combinação de morte, infarto não fatal, acidente vascular cerebral não fatal e revascularização coronariana ou periférica como desfecho secundário. O escore de DL-CAC classificou os pacientes em três grupos: DL-CAC = 0, 1-99 e ≥100.
A população analisada constou de 5678 pacientes, dentre os quais 50,7% eram mulheres, 18% asiáticos e 13% hispanos/latinos, com uma idade média de 60,5 ± 16,2 anos. 52% dos pacientes tinham um DL-CAC > 0, e 33,4% apresentavam um DL-CAC ≥100. Aqueles que tinham um escore mais alto eram mais idosos, em sua maioria homens e apresentavam um maior risco cardiovascular e um maior uso de medicamentos. Durante um seguimento médio de 4,8 ± 2,7 anos, a taxa de mortalidade foi de 3,87 por cada 100 pessoas por ano na população geral e de 6,06 por cada 100 pessoas por ano naqueles com DL-CAC ≥ 100.
Comparando-se com os pacientes com DL-CAC = 0, o grupo com um escore de 1-99 tinham 33% mais de eventos de morte, infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral, com um risco relativo (HR) de 1,33 (95% IC: 1,12-1,57). No grupo com DL-CAC ≥100, o impacto foi ainda maior, com um HR de 2,22 (95% IC: 1,95-2,53). Ao ajustar o modelo para a mortalidade, observou-se que o grupo com DL-CAC ≥ 100 tinha mais de 50% de risco adicional de mortalidade, com um HR de 1,51 (IC 95% 1,28-1,79).
Conclusões
Em conclusão, a presença de CAC incidental quantificada como ≥ 100 mediante um algoritmo de deep learning com inteligência artificial se relacionou com um maior número de eventos cardiovasculares e de mortalidade. Portanto, considerar esses achados de maneira sistemática e sob protocolo poderia contribuir para uma detecção precoce de pacientes assintomáticos com o objetivo de reduzir a morbimortalidade cardiovascular.
Dr. Omar Tupayachi.
Membro do Conselho Editorial da SOLACI.org.
Título Original: Association of Coronary Artery Calcium Detected by Routine Ungated CT Imaging With Cardiovascular Outcomes.
Referência: Peng A, Dudum R, Jain S, et al. Association of Coronary Artery Calcium Detected by Routine Ungated CT Imaging With Cardiovascular Outcomes. J Am Coll Cardiol. 2023 Sep, 82 (12) 1192–1202.https://doi.org/10.1016/j.jacc.2023.06.040.
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