SCA e doença de múltiplos vasos: como proceder?

Gentileza do Dr. Javier Castro.

 

sindrome coronária aguda e doença de múltiplos vasosOs pacientes com síndrome coronária aguda com supradesnivelamento do segmento ST apresentam na prática diária uma alta porcentagem de doença associada de múltiplos vasos coronários (40-65%). Este grupo apresenta pior evolução clínica e maior mortalidade que os pacientes com doença em um só vaso.

 

No momento da realização da angioplastia primária de um paciente com lesões significativas em mais de um vaso podemos formular diversas estratégias:

 

  • Tratamento do vaso responsável e avaliar clinicamente a necessidade de tratar os outros vasos.

 

  • Tratamento do vaso responsável, com lesões significativas durante o mesmo procedimento.

 

  • Tratamento do vaso responsável e tratamento diferido das artérias não responsáveis que possuírem lesões significativas.

 

De acordo com os Guias da Sociedade Europeia de Cardiologia, só se deveria realizar angioplastia de múltiplos vasos durante uma síndrome coronária aguda com supradesnivelamento do segmento ST caso haja choque cardiogênico ou placas instáveis com isquemia persistente após a angioplastia bem-sucedida do vaso responsável.

 

Diante da existência de um número limitado de estudos prospectivos – a maioria com escassa potência estatística e analisando somente pontos combinados com ênfase, principalmente, na necessidade de nova revascularização e não na mortalidade –, o grupo do Dr. Tarantini et al. realizou a presente metanálise dos principais trabalhos incluindo mais de 54.000 pacientes.

 

Foram avaliados os estudos de angioplastia primária em pacientes com doença de múltiplos vasos realizados entre 2011 e 2015.

 

Selecionaram-se 32 estudos: 13 prospectivos e 19 retrospectivos, incluindo um total de 54.148 pacientes.

 

O objetivo primário do estudo foi a mortalidade por qualquer causa em curto e longo prazo.

 

Estes pacientes foram incluídos nos grupos da seguinte maneira:

 

  • Angioplastia somente do vaso responsável (AVR): 42.112 pacientes.
  • Angioplastia do vaso responsável e dos demais vasos com lesões significativas no mesmo procedimento (AMV): 8138 pacientes.
  • Angioplastia do vaso responsável + angioplastia diferida dos demais vasos com lesões significativas (ADMV): 3.898 pacientes.

 

[A angioplastia diferida se realizava durante a internação e até dois meses após à AVR].

 

Resultados

  • A mortalidade em curto prazo evidenciou que os pacientes ADMV apresentaram uma menor mortalidade quando comparados com os pacientes AVR (1,9% vs. 4,9%; p = 0,002) e com os pacientes AMV (1,4% vs. 5,6%; p =< 0,0001).

 

  • Também se evidenciou uma menor mortalidade no grupo AVR quando se comparou com o grupo AMV (6,9% vs. 8,0%; p = 0,04).

 

  • A mortalidade em longo prazo evidenciou que os pacientes com ADMV apresentaram uma menor mortalidade quando comparados com os pacientes AVR (4,1% vs. 6,8%; p = 0,001) e com os AMV (3,1% vs. 8,5%; p =< 0,0001)

 

  • Ao excluir os pacientes com choque cardiogênico, a ADMV manteve uma menor mortalidade no curto e no longo prazo.

 

  • No subgrupo de pacientes diabéticos: para maior taxa de doença de três vasos, maior o benefício de sobrevida em longo prazo no grupo de ADMV.

 

Conclusão

A angioplastia do vaso responsável se associou a uma maior sobrevivência em curto e longo prazo que a revascularização completa durante a angioplastia primária.

 

A revascularização completa escalonada teve menor mortalidade em curto e longo prazo que a revascularização de somente o vaso responsável e que a revascularização completa realizada durante a angioplastia primária.

 

Para maior número de vasos comprometidos, maior parece ser o benefício de uma revascularização completa.

 

Comentário editorial

O conceito de que em STEMI a estratégia de revascularização deve se limitar ao vaso responsável foi questionado a partir do estudo PRAMI, que mostrou diferença significativa em eventos duros a favor de uma estratégia de revascularização completa no momento do procedimento inicial.

 

Dois anos depois, foi publicado o estudo CULPRIT, que, do mesmo modo que o anterior, compara ambas as estratégias, embora com revascularização completa realizada em 60% dos pacientes no momento da angioplastia primária e no resto de forma diferida. Neste estudo, a diferença se mostrou no desfecho combinado e não em eventos duros.

 

O estudo PRIMULTI, no qual a revascularização completa foi realizada de forma escalonada e guiada por FFR, só mostrou diferenças significativas no desfecho combinado, devido a uma menor necessidade de revascularização.

 

A presente metanálise considera estes e outros estudos e registros, e analisa a mortalidade em curto e longo prazo como desfecho. Os resultados devem ser considerados levando em conta o elevado índice de heterogeneidade quando são incluídos os registros retrospectivos.

 

Os resultados da comparação das três estratégias, tanto para mortalidade de curto como de longo prazo, são diferentes de acordo com o fato de incluírem estudos prospectivos ou retrospectivos, e a revascularização completa durante a angioplastia primária ou de forma escalonada e devem ser considerados levando em conta estas variáveis mais o dado da elevada utilização de inibidores glicoproteicos IIb-IIIa na maioria destes estudos.

 

Finalmente, é necessário ter presente que na atualização 2015 dos guias americanos, a recomendação para uma estratégia de revascularização completa, tanto de forma imediata quanto de forma escalonada, deixou de estar contraindicada e tem uma recomendação de classe IIb com nível de evidência b.

 

Gentileza do Dr. Javier Castro. Hospital San Juan de Dios, Ramos Mejía, Argentina.

 

Título original: Survival after varying revascularization strategies in patients with ST- segment elevation myocardial infarction and multivessel coronary artery disease. A Pairwise and Network Meta-Analysis.

Referência: Tarantini et al. J Am Coll Cardiol Intv 2016;9:1765-76.

 

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